O
empreendimento colonialista para além das pilhagens de que se tem conhecimento,
significou a instalação de virulências de naturezas diversas, sobressaindo-se,
as de ordens política em que antagonismo sócio-cultural foi pedagogicamente
trabalhado entre os grupos étnicos de forma a potencializar diferenças não
significativas (Cf. Wlly Lynch), bem como a de cunho sanitário devido as inoculações sejam
materiais e simbólicas introjetadas nos imaginários, assim disseminadas através
da dispersão transatlântica como dos séculos. Como num continuum tais mecanismos complexificam-se face à dinâmica da
“colonialidade” que funciona como organismo que hospeda e nutre tais
virulências contemporaneamente.
A
modernidade, “ligada à ideia de nação”[1]
e como “fenômeno exclusivamente europeu”[2], instaurou a cultura da violência e da morte,
produzindo genocídios e massacres em massa de populações colonizadas, assim
como incutiu comportamentalidade suicida que tem se traduzido tanto material
como simbolicamente por conta da perspectiva de vida introjetada nos
“condenados da terra” (Frantz Fanon). Nesta direção, verdadeiros ingredientes e mecanismos
produtores de doença e redutores de vida tem atingido seres humanos que se
inscrevem num dado perfil como num quadro das vulnerabilidades com seus
componentes sociais de acordo com Lopes (2003)[3]
e seus interlocutores/as em se tratando do HIV/AIDS.
De acordo
com Lopes (2003, p. 1) “para além das conexões aids-subdesenvolvimento;
aids-pobreza; aids-insegurança/instabilidade econômica que estão subtraindo
vidas, chama a atenção a perda de vidas femininas. Por diversas razões, tais
como a falta de poder, falta de informação e acesso aos recursos preventivos,
exploração sexual por razões comerciais, a proporção de mulheres vivendo com
HIV/AIDS vem aumentando contundentemente […]”.
Ao se deter a definição de vulnerabilidade, a autora citada chama a atenção para a implicabilidade entre
vulnerabilidade e raça como constatação persistente seja nas pesquisas
acadêmicas, nos dados da vigilância epidemiológica como nos atestados de
óbitos.
Localizados
nas periferias dos centros urbanos em meio às populações socialmente
vulneráveis, as/os Terreiros/as historicamente funcionaram a assim continuam
como verdadeiros "equipamentos sociais". Neste sentido incidem na sociedade
brasileira e gaúcha de forma a desafogar e significativamente os serviços
públicos que envolvem o bem estar social, notadamente, no que diz respeito à
saúde pública. Edson Carneiro ao dissertar sobre Omolu como o médico dos pobres e a situação da saúde da população negra e
pobre na metrópole soteropolitana no enfrentamento da varíola no Brasil,
evidencia o papel de Nanã como a propulsora da saúde para tais populações.[4]
A produção
de saúde e o combate ao HIV/AIDS pelos Terreiros encontra relevância civilizatória, extrapolando assim, as
atribuições apenas ou tão somente como locus
onde se exercem categorias do jargão da
política assistencial vigente em que caridade, acolhida e solidariedade,
circunscrevem-se a espaços religiosos, bem como da prática da chamada medicina
alternativa.
O terreiro
configura-se como um equipamento civilizatório no qual reside todo um projeto de
existência amalgamado na diáspora, mediante as invariáveis(Honrat Aguessy citado por Luz, 1983) culturais dos grupos
étnicos desenraizados e desterritorializados do hoje continente africano. A
concepção de Ser Humano, da Vida ou da Existência no que tange ao Todo, tanto
dos princípios cósmicos, como dos princípios éticos de acordo com Sodré (1988,
p. 108) convertem-se em “forças aglutinadoras e de solidariedade grupal”,[5]
de forma a potencializar, cuidar e engendrar a Vida e nunca diminuí-la sob
nenhum pretexto ou ameaças. Nos terreiros estão implícitos e explícitos uma
pedagogia da vida e não da morte, de
cujo potencial incide seja no
combate ao HIV/AIDS, Tuberculose e Hepatite Virais, sobremaneira.
Proposta de texto elaborado
por Jayro Pereira de Jesus
e-mail: jaypjesus@hotmail.com
[1]MORIN,
Edgar. Cultura e barbárie europeias. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. p.
73
[2]DUSSEL,
Enrique. Ética da libertação: na idade da globalização e da exclusão.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.p. 51.
[3]LOPES,
Fernanda. Mulheres Negras e Não Negras vivendo com HIV/AIDS no Estado de São
Paulo: Um estudo sobres suas vulnerabilidades.
2003. 175 f. Tese (Doutorado) – Departamento de Epidemiologia, Faculdade
de Saúde Pública, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2003.
[4]Cf.
SOUZA JUNIOR, Vilson Catetano de. Iya Agba Yin, A Mãe mais Velha. Disponível
<http://vilsoncaetanodesouzajunior.blogspot.com.br/>.
Acesso em: 17 out. 2012.
[5]SODRÉ.
Muniz. O terreiro e a cidade: A forma social negro-brasileira. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1988.