Na terça-feira, terceiro dia de Didá-Ará, iniciou com
relatos de experiência de ações e questões de comunidades de matriz africana de
diferentes localidades do Brasil. Iyalorixá Torody do Ilé Àse Ala Koro Wo, no
Rio de Janeiro, trouxe a experiência de sua comunidade com a comunicação a
partir da criação de uma rádio comunitária, bem como a fundamentação desta ação a partir da tradição
de matriz africana. Segundo a Iyalorixá, muitas coisas que existem hoje nossos
ancestrais já faziam, de outras formas, mas já faziam. É fundamental, portanto,
que mantermos estas ações. Uma delas é a comunicação. Na tradição de matriz
africana temos vários instrumentos de comunicação no Aiyê e no Orun, do Aiyê
para o Orun ou vive-versa. Ibiri, Xacará, Ogué, Okutá, Ekó, Abará, Mokan, Okun
são todos instrumentos ancestrais de comunicação, são todos comunicadores.
Assim é fundamental que as comunidades de matriz africana também atuem na
comunicação, informando uns aos outras transmitindo o Asè e informando,
reproduzindo, multiplicando e exercendo a tradição, ainda mais, num contexto em
que as telecomunicações estão dominadas por aqueles que difamam nossa forma de
ser e vivenciar nossas práticas.
Babalorixá Jorge Kibanazambi do Ile Àse Ayra Kinibá, do
Paraná, expressou-se quando a dificuldade que hoje os terreiros tem de cultuar
a tradição, tendo em vista que cada terreiro é como um quilombo urbano, ou
seja, cada vez mais somos sitiados e impedidos de desenvolver nos práticas de
vida. Baba Kibanazambi denunciou a recente intenção de criação de uma lei, em
nível nacional, para impedir a sacralização de animais. O Babalorixá ressaltou também o poder que
cada terreiro que cada Iya e Baba tem,
pois somos muitos, é precisamos nos pronunciar, precisamos falar para que parem
de nos colar nas periferias, de nos isolar; para que parem de criar dificuldades
para manutenção de nosso pode de vida, de nosso sagrado, visto que impedir eles
nunca conseguiram, pois a tradição
sempre existirá. Para que possamos falar, temos que deixar as vaidades de lado,
pois quando o Estado, os brancos, os outros, falam da gente eles usam o
coletivo, “esse povo do candomblé”, diz o Babalorixá. Assim, não adianta agirmos “só na minha casa”, temos
que agir enquanto coletivo, somos responsáveis pela manutenção da tradição na
forma como tem que ser. Para Baba Kibanazambi “a guerra existe e não podemos
mais ficar em cima do muro”.
Ogan Silvestre, presidente da Accuneraa em Roraima, trouxe a
preocupação quando a sustentabilidade ambiental de nossas práticas e quando a qualidade do que temos oferecidos
aos Orixás e à nossa ancestralidade. Antigamente os terreiros tinham espaço,
criavam suas galinhas, hoje, compramos essas criadas em granja, mas que galinha
é essa? Com o que ela foi alimentada? O que ela come? Para o Ogan, nossa saúde,
nosso corpo são constituídos pela ancestralidade, sendo fundamental a qualidade
do que oferecemos para construção do nosso sagrado. O Ogan finaliza pontuando
que o acesso a terra, a territórios, devem ser também entendidos como promoção
de nossa saúde em sua complexidade.